sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

O futuro da Europa

O futuro da Europa não está na UE nem no BCE nem na união bancária, fiscal e política. Quanto à moeda, o euro, deixo aos economistas essa avaliação.
O futuro da Europa está em reconhecer, em primeiro lugar, o falhanço do projecto europeu, os desvios, os erros, as mentiras, o desrespeito pelos cidadãos. Esta fase de reconhecimento da realidade é fundamental.
A seguir, há que analisar, caso a caso, a armadilha da dívida em que se colocaram países e pessoas concretas. Aqui já não é apenas a CE, o BCE, o FMI, que estão a ser avaliados, é também a gestão e opções dos governos desses países. No nosso caso, os governos do PSD e do PS, desde a negociação das condições de adesão até à aceitação do programa austeridade, passando pela análise e natureza da dívida. Chegaremos à conclusão que não será com estes partidos e estes políticos que conseguiremos sair desta armadilha, uma vez que a situação actual os favorece. Este é, aliás, o nosso maior desafio, encontrar alternativas políticas viáveis.

Quando visualizo o futuro da Europa surgem 2 cenários, ainda sobrepostos, talvez por serem ambos prováveis:

1 - a união bancária avança, independentemente da opinião dos cidadãos europeus, à semelhança dos tratados e mais tratados em que não se recorreu ao processo democrático do referendo. Para dar a volta a esta falha, os tecnocratas multiplicarão os debates, as palestras, o marketing político na internet, e os governos irão papaguear as receitas no mesmo tom: para salvar o euro... uma almofada de segurança para os países e os contribuintes... O marketing mais cínico é, aliás, este: Você é que escolhe a Europa que quer. A sério?
A seguir à união bancária - o passo decisivo do controle absoluto dos países e das pessoas -, já será mais fácil concluir todo o processo: união fiscal e política. Adeus, democracia, possibilidades de referendo, a chatice dos parlamentos e dos tribunais constitucionais. Agora mandam os mais fortes e tudo fica mais simples. À rebeldia responde-se com a clausura forçada em instituições preparadas para a reabilitação mental e emocional, um nicho de mercado para psiquiatras e neurocientistas, actividades que se dão muito bem com a linguagem do poder (Arno Gruen em A Traição do Eu). Muita dessa rebeldia poderá ser neutralizada com os mecanismos tecnológicos tão em voga, a vigilância dos cidadãos e o controle da internet. Pode parecer ficção científica, mas os meios já existem.
Neste ponto, começaremos a ter saudades do tempo em que os filmes nos mostravam as personagens ávidas de poder como loucas e mesquinhas. Hoje, são pessoas de sucesso (Arno Gruen em A Loucura da Normalidade e Os Falsos Deuses):



Frank Capra reconhece a impossibilidade de negociar com tais personagens, aqui representadas pelo velho Potter.



De qualquer modo, neste cenário do futuro da Europa já não há lugar a negociação possível. A união bancária já avançou, lembram-se? Da união bancária à união fiscal e política foi um passo, lembram-se? Todos os mecanismos democráticos a que quiserem recorrer (boa sorte!) serão facilmente neutralizados pelo marketing em nome da segurança e pelo atestado de perturbação mental que lhe passarão se se atrever a contradizer a realidade oficial. É simples.

2 - os cidadãos europeus organizam-se em comunidades criativas supra-nacionais, procuram obter informação fidedigna sobre a armadilha da dívida, sobre os erros cometidos pela CE, o BCE, o FMI, e sobre a natureza pouco democrática da UE. Questionam as instituições nas plataformas adequadas, avançam com petições, exigem referendos sobre as grandes opções que decidirão da sua vida e da dos seus filhos.
Os governos dos países membros são igualmente avaliados e responsabilizados pelos erros cometidos, no nosso caso desde a própria adesão até à austeridade e alienação dos recursos estratégicos, passando pela dívida contraída. Os cidadãos de cada país exigirão informação sobre a natureza da dívida e sobre as negociações com a troika. Os cidadãos quererão saber quem lucrou com a austeridade, quem lucrou com a desgraça nacional e o empobrecimento geral da população. Os cidadãos quererão participar nas grandes decisões para o seu futuro colectivo: recursos estratégicos, negócios ocultos, o verdadeiro papel dos partidos no parlamento, a grande evasão fiscal, os cortes, o aumento da dívida, os juros usurários. 
Depois, quererão participar nas grandes opções para o seu futuro e dos seus filhos: as áreas onde se deve investir, a gestão dessas áreas, a avaliação dessa gestão, a transparência da informação. Claro que isto implica cidadãos atentos e responsáveis, que conseguem colocar o colectivo acima dos seus interesses individuais, porque perceberam que dessa forma todos ganham, a grande comunidade. Aqui entram também os conterrâneos espalhados por todo o planeta.
A Europa neste cenário será uma construção dos cidadãos europeus. Como a visualizo? Países livres de decidir, acordo a acordo, tratado a tratado, com cada um dos outros países europeus e de outros continentes. Na Europa, por exemplo: Espanha é o nosso maior cliente europeu, é natural que se estabeleçam acordos especiais entre estes dois países; Portugal é um dos melhores clientes europeus da Alemanha, seria expectável um retorno comercial ou outro; temos uma comunidade considerável em França, assim como em Luxemburgo, Alemanha, Suiça, e Inglaterra mais recentemente, o que também poderia traduzir-se numa interacção a outros níveis; os países mediterrânicos partilham uma cultura própria, têm muito em comum; Portugal tem sido apontado como país periférico em relação à Europa, mas neste cenário Portugal seria um país estratégico nas relações comerciais atlântico e mediterrâneo.
Frank Capra também nos mostra este cenário como possível:



   

Sem comentários:

Enviar um comentário